Com a discussão do chamado Ciclo Completo de Polícia, veio também à baila a proposta de "Carreira Única" para as Polícias.
A pergunta é: existe "Carreira Dupla"?
O conceito de carreira hoje em dia é diferente de tempos atrás, entretanto no serviço público - e em especial nas chamadas "Carreiras de Estado" - o sentido ainda é o clássico: ascensão hierárquica vertical da base ao mais alto nível. Partindo desse entendimento, para os servidores públicos, carreira tem a ver com a função exercida dentro da administração.
Disso advém que carreira, seja ela qual for, será sempre única, vez que não se consegue ter duas carreiras em uma só profissão. É como se emprestássemos a lei da física em que "dois corpos não podem ocupar o mesmo local do espaço no mesmo instante de tempo".
Baseados nisso é errado dizer Polícia de Carreira Única e, o que é pior, querer criar uma "Polícia de Carreira Única".
E explicaremos!
Há um sofisma conceitual aí, mas esperem um pouco...
Com a discussão do Ciclo Completo de Polícia, que também já explicamos aqui, as Associações dos Agentes da Polícia Federal e das demais carreiras das Polícias Civis começaram a pleitear que suas Instituições passassem a ser de Carreira Única.
Aqui cabe um parêntese histórico.
Na realidade a Polícia Federal só passou a existir realmente como uma Polícia Organizada a partir de nossa Constituição de 1988, pois antes ela era mais uma espécie de Força Tarefa com servidores policiais dos Estados que eram nomeados por certo tempo. Como a maioria dos Delegados que foram chamados a compor seus quadros, por períodos diversos, eram da Polícia Civil do Estado de São Paulo, ela acabou tendo as feições dessa Organização Policial, onde as carreiras dentro dessa Polícia são estanques e independentes.
É o que acontece com a Polícia Civil do Estado de São Paulo, que possui 7 carreiras estanques e independentes*.
O correto conhecimento desse assunto é fundamental para que nossos legisladores, ao pensarem sobre o tema, possam decidir e propor algo dentro do que existe pelo mundo, organizando nossas Polícias adequadamente.
A questão não é a existência de uma Polícia de Carreira Única, mas sim de que todas sejam Polícias de Carreira, o que é bem diferente e o que é, em realidade, o que se pleiteia; e muito justamente, por sinal.
Talvez nosso leitor ou leitora esteja pensando: e qual a diferença?
A diferença está no fato que quando você tem uma Polícia de Carreira, a ascensão se dá por mecanismos internos, sem a necessidade de concursos externos outros para intercambiar entre as funções. Nas Polícias Militares, por exemplo, um Soldado pode chegar a Oficial (até o Posto de Major) por concursos internos da própria Instituição; entretanto, na Polícia Civil, não!
Caso um Investigador queira ser Delegado, ele vai prestar outro concurso público, externo à Instituição, para poder desempenhar as funções de Delegado; ou seja, ele vai mudar de carreira.
Na realidade a Polícia Civil - com todo o respeito, mas isso é verificável à luz das Ciências da Gestão - sequer pode ser chamada de Polícia no estrito sentido do termo. O que nós temos são 7 Carreiras de Estado sob uma bandeira chamada Polícia Civil.
O mesmo vale para a Polícia Federal.
Portanto, o que caracteriza uma Polícia de Carreira de outra que não é de Carreira, é a possibilidade de seus integrantes poderem evoluir na estrutura hierárquica-funcional mediante mecanismos internos de promoção.
Por isso o pleito das Associações dessas Polícias está coberto de razão, vez que só pertencendo a uma Polícia de Carreira é que eles serão reconhecidos e se sentirão Policiais.
Afinal, Carreira Única eles já vivem, pois nunca poderão ascender à cúpula de suas Organizações.
Mas e o sofisma que você falou ali em cima?, pode perguntar o atento leitor.
Confunde-se no discurso de Carreira Única o Sistema de Recrutamento ou Seleção de quem vai pertencer a esta Polícia. O fato de uma polícia ser de carreira, em nada invalida que ela possa ter uma ou mais entradas na carreira e ainda sim ser a mesma carreira.
Quando se fala em Carreira Única, estão pleiteando que todas as Polícias tenham um Sistema de Seleção em que todos entrem na base da pirâmide organizacional.
Creio que isso não seja bom nem para a sociedade e nem para a instituição; mas isso é matéria para outro post.
* (Delegado, Investigador, Escrivão, Agente, Papiloscopista, Auxiliar Papiloscopista e Agente de Telecomunicações)
Quem quiser saber mais sobre as Carreiras da Polícia Civil é só clicar. Sugiro em relação ao tema abordado aqui, ler as observações ao final da página da Wikipédia.
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