Polícias Militares Bolsonaristas!

Em dois artigos publicados, um pela Revista Piauí, vinculada ao Grupo Folha, e outro n'O Estado de São Paulo, Renato Sérgio de Lima, Presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, e o Coronel da Polícia Militar Glauco Silva de Carvalho, hoje na Reserva, acusam as Polícias Militares do Brasil, em geral, e a de São Paulo, em particular, de serem "antros" do chamado bolsonarismo, chegando a questionar sua lealdade.

Nada soa mais falso e irremediavelmente errado. 



Formatura de Soldados da Polícia Militar do Estado de São Paulo - Créditos Du Amorim

Nada dói mais a um estudioso de qualquer área da ciência humana do que um sofisma, mas não o sofisma do erro inocente de eleger o analista, por desatenção, uma premissa errada; mas o sofisma enquanto ação deliberada, qual seja, o silogismo sofístico.
É exatamente sob o ardil do silogismo sofístico que se constroem as hoje famosas e denominadas "narrativas".
Em tempos de Antifas e Black Lives Matter, há nos Estados Unidos, governadores  e prefeitos liberais (nos EUA liberal é sinônimo de esquerdista, ou de progressista se assim preferirem), obviamente do Partido Democrata, que já aceitam e buscam implementar a ideia de acabar com a Polícia; o que em si é um perigo real, pois o Modelo Anglo-saxão de Polícia permite, dentro da filosofia do "policiamento por consentimento". Já escrevemos isso em outro artigo.
É algo parecido como esse imbróglio que querem meter as Polícias Militares.
E é silogismo sofístico o que vemos ao ler dois artigos do Presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima e do Coronel da Polícia Militar Glauco Silva de Carvalho, que hoje encontra-se na reserva. Um foi publicado em 29 de maio deste ano na Revista Piauí, pertencente ao Grupo Folha, em que ambos o assinam; o outro foi escrito pelo repórter Marcelo Godoy n'O Estado de São Paulo, porém ambos são preferencialmente referenciados e repetem o que escreveram na Piauí.
Em ambos os artigos é questionada a lealdade das Polícias Militares brasileiras, e a Paulista em especial, ao buscarem rotular seus membros como bolsonaristas. Não há outro adjetivo para quem especula uma coisa dessas que não seja a de sofista.

Brasão da Polícia Militar do Estado de São Paulo, com o lema Lealdade e Constância.

Vejamos o título da matéria da Piauí: Bolsonaro seduz Policiais Militares com promessas de cargos e poder. No subtítulo: Entre o capitão e os governadores, é preciso saber para onde irá a Polícia Militar.
Posso compreender o fato do Renato Sérgio de Lima não conhecer o lema "Lealdade e Constância" da Polícia Militar do Estado de São Paulo, mas o Coronel Glauco estranha-me. Passou 35 anos de sua vida na Instituição, portanto sabe que somos leais, não a um governante de turno, mas à lei e à ordem.
Não é isso o que emerge da matéria!
Sugiro que você leitor ou leitora pare um tempo de ler aqui e vá ler este artigo da Piauí para entender o que estamos argumentando e a digressão que iremos fazer.
Os autores introduzem o leitor num raciocínio analítico que culmina na descrição, ou seja, na síntese do caráter de uma pessoa que aprove ou apoie o governo federal, que eles, como a mídia "mainstream", confundem como a de seguidores de Jair Bolsonaro.
É nesse balaio que eles jogam as Polícias Militares.
[...] são as Polícias Militares e não as Forças Armadas que exercem o papel real de fiadoras da ordem pública no cotidiano da população.
Sempre afirmei isso aos meus alunos do mestrado e do doutorado da Polícia Militar do Estado de São Paulo: exércitos derrubam regimes, mas só a polícia é capaz de mantê-los.
Em igual medida afirmo que a Polícia, nas sociedades livres, é a fiadora e defensora da democracia (eu e autores como David H Bayley, Herman Goldstein, Jean-Claude Monet e outros); por isso regimes totalitários se apressam a criar "polícias" novas, quando ascendem ao poder (vide aqui ao lado nossa vizinha Venezuela, que criou a Guarda Nacional Bolivariana e a Polícia Nacional Bolivariana, esta última com um histórico sanguinário na repressão a manifestações).
[...] O que, em outras palavras, nos faz questionar qual posicionamento tomariam as Polícias Militares e/ou seus integrantes diante de uma tentativa de ruptura do ordenamento institucional e/ou, mais imediatamente, da decretação de um lockdown por governadores para o combate da Covid-19.
Eis o núcleo do questionamento do artigo em relação à lealdade das Polícias Militares!
A primeira coisa que chama a atenção é a utilização d'uma expressão vaga e difusa e muito na moda: ruptura institucional. Pois faço a pergunta do milhão aos articulistas: o que é, ou o que significa, ruptura institucional? Está lançado o desafio!
Fiquemos porém nas hipóteses constitucionais, como a intervenção federal conforme os artigos 34, 35 e 36. Os articulistas sugerem que por ser Bolsonaro desafeto político de Dória a Polícia Militar Paulista não deveria cumprir o que prevê o §6º do artigo 144 da CF? Ou, dentro da lógica impressa por eles no periódico, a PM Paulista só cumpriria o mandamento constitucional porque é bolsonarista?
É isso?
A segunda é a criação surrealista do tal lockdown. Esse delírio que encharca a mente dos jornalistas e articulistas mainstream simplesmente não existe no ordenamento jurídico brasileiro!
Não sei se Renato Sérgio de Lima é formado em direito, mas o Coronel Glauco o é pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da USP; então ele sabe que essa coisa de lockdown não existe. Nossa Constituição Federal só prevê duas situações em que se restringem as liberdades constitucionais das pessoas: o Estado de Defesa (art. 136) e o Estado de Sítio (art. 137).
Sequer a lei que definiu a emergência da covid-19, a 13.979/2020, prevê tal aberração.
Diante disso o que propõem os autores do artigo? Que as PM cumpram uma ordem manifestamente ilegal de governadores e se verguem ao seu senhor e, aí sim, submetam-se à vontade de um "salvador da pátria", como eles mesmos tacharam o líder populista que não lhes agrada?
Em termos formais, um elemento pouco lembrado na atual crise é que as Polícias Militares são constitucionalmente consideradas 'forças auxiliares e reserva do Exército'. [...]
Isso é realmente verdade, pelo já citado §6º do artigo 144 da CF, o que não é nenhuma novidade, pois somos assim considerados desde a Constituição de 1934, conforme pode ser lido em seu artigo 167. Tem sido assim desde então! Tal nos coloca em uma situação em que temos que atender ao chamamento do Exército e, em última instância, do Presidente da República (qualquer presidente!) que é o Comandante em Chefe das Forças Armadas.
Isso deixa claro que a lealdade das Polícias Militares está vinculada à constituição e às leis, apesar do apelo ao onírico lockdown.
Há que se destacar a atenção perseverante dos autores de impingir à imagem das Polícias Militares e de seus integrantes a pecha de meros seguidores bovinos de um líder supremo e divino.
Diante do negacionismo do governo federal em relação à doença, tomemos como hipótese que o estado de São Paulo seja obrigado a adotar lockdown. Por uma questão meramente política, Bolsonaro, a fim de enfraquecer o governador João Dória (PSDB), um de seus maiores desafetos, passa a confrontá-lo para criar antagonismo e delimitar o debate ideológico. O presidente assume, então, uma postura radicalmente contrária à medida e torna seu posicionamento não apenas explícito, mas orienta a população a não cumprir a diretriz.
Eis o lockdown e a delimitação entre Dória versus Bolsonaro. Agora vem o ponto alto:
Nessas circunstâncias, não esquecendo que amplo espectro dos integrantes da PM paulista adota Bolsonaro como "ídolo", "mártir", um "modelo" a ser seguido (cegamente), que veio para resgatar a moral e os bons valores da sociedade, bem como restabelecer a ordem e a imposição da lei a todo o povo, é possível supor dificuldades consideráveis de enforcement para a aplicação do lockdown, mas é pouco provável que isso ocorra de forma coordenada, assumida e de afronta às autoridades legais.
Quer dizer então que a PM Paulista (em maiúsculo pois tenho orgulho de ser Paulista) não vai cumprir uma ordem manifestamente ilegal em relação a uma coisa que não existe no ordenamento jurídico chamado lockdown por que idolatramos o Bolsonaro? É isso?
Com base em quê, sofistas, vocês chegaram à essa conclusão que idolatramos (ou que a Instituição Policial Militar Paulista idolatra) o Presidente Jair Messias Bolsonaro? Qual a pesquisa? Quais as fontes, primárias ou secundárias, que lhes permitiram chegar à confirmação dessa pungente hipótese?
Ambos são pesquisadores, mostrem!
Ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública não falta dinheiro, pois segundo o Portal da Transparência do governo federal, desde 2015 já receberam R$9.471.091,71, sendo que a última "ajudinha" federal foi em 26 de dezembro de 2018 (natal, não é mesmo?) no valor de R$340.000,00, do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos da Secretaria Nacional do Consumidor (documento 2018OB800015).
Para apimentar esse questionamento sobre verbas para uma pesquisa que demonstre que, bolsonarista ou não, a PM Paulista iria agir com base na ilegalidade para incensar um ou outro ídolo, trago o balanço do próprio FBSP de 2018 (não há ainda o de 2019), onde podemos verificar o aporte de R$1.006.032,00 da Open Socity Fundation, do bilionário americano George Soros.
Todos sabem que a OPS de Soros tem viés ideológico e não é afeita à democracia, ordem e liberdade.
Aparentemente dinheiro não falta.
Após questionarem a lealdade das Instituições, logo depois os autores "afagam" as PM, mas mantém a acusação da idolatria cega aos seus integrantes, entretanto, depois de loas ao profissionalismo, à padronização dos procedimentos, vem outro golpe que eu afianço ser deliberado por Renato, mas talvez despercebido pelo Coronel: uma divisão de luta de classes dentro da Instituição, opondo oficiais e praças.
[...] ao se agregar os dois grandes seguimentos das instituições militares (oficiais e praças), algumas diferenças se impõem. O seguimento dos oficiais (tenentes, capitães, majores, tenentes-coronéis e coronéis), de forma sutil e não acentuada, se desconectou de Bolsonaro [...] O outro seguimento, o dos praças (soldados, cabos, sargentos e subtenentes), permanece quase que monoliticamente atado ao bolsonarismo.
De novo: com base em quê se arvoram para fazer tal afirmação?
Todas as organizações possuem uma coisa que se convencionou denominar de subcultura e com as Polícias não é diferente. Na Polícia Militar de São Paulo há uma ampla tendência (e isso faço por inferência empírica) das praças, e até mesmo dos oficiais subalternos e capitães, de acharem (é achar de presumir) que o Comando da Instituição, e não os oficiais como um todo, é subserviente ao governante de turno. Por isso as afirmações destacadas acima passam a ter grande importância na estabilidade institucional, pois um Coronel da PM está a afirmar que oficiais e praças se distinguem "ideologicamente".
Essa divisão sobre visão de mundo simplesmente não existe!
O Coronel Glauco é admirador de um sociólogo britânico que escreveu um livro sobre A Política da Polícia, que é Robert Reiner.
Em seu livro, a partir da página 146, ele discorre sobre o caráter conservador da Polícia e dos policiais. Aqui o termo deve ser interpretado pelo seu significado político-sociológico, que é o Conservadorismo, enquanto visão de mundo. Ora, o governo de Jair Bolsonaro é o que se tem de mais próximo de um governo de viés conservador, por isso o apoio dos policiais; fulanizar a questão é tornar raso o debate e buscar desqualificar não só uma opinião divergente, como toda uma categoria de profissionais firmemente imbuída do cumprimento da lei e da ordem.
Exatamente por buscar emprestar à sociedade um pouco de ordem, com os parcos recursos, que ela Polícia tem esse viés conservador como anotado por Reiner e que simplesmente é ignorado pelos autores.
Ignorar isso é sofismar e buscar criar uma narrativa de que as Polícias Militares são um perigo à democracia porque não querem ver o povo subjugado pela força do estado visando atender aos caprichos do governante de turno.
Dentre as categorias que a Polícia não vê com bons olhos está a dos políticos (página 145). Tenham certeza Renato e Coronel Glauco que se Bolsonaro fizer algo realmente errado de verdade e não os factoides gestados em poluções noturnas da mídia mainstream e outros oposicionistas, a primeira coisa que a Polícia irá fazer, se possível e com prazer, é prendê-lo.
Em relação ao artigo d'O Estado de São Paulo, ali a posição é mais abjeta!
Salvaguardados pelo repórter Marcelo Godoy, pode-se destilar todo o preconceito contra a Polícia Militar Paulista e seus integrantes, "coitadizando" o governador de São Paulo e nos pondo como milícia a serviço de Bolsonaro.
Uma vergonha o artigo!
Se Dória acusa a Gloriosa Polícia Militar do Estado de São Paulo de bolsonarista e partidária, o que estaria ele fazendo ao tentar despartidarizá-la? Partidarizando?
Outro sofisma que Renato Sérgio de Lima e o Coronel Glauco Silva de Carvalho endossaram!
Desde quando a PM toma partido? O PSDB governa o estado desde 1996 e quando foi que deixamos de cumprir o lema de servir à sociedade, mesmo sendo massacrados por cada um que ocupou a cadeira do Palácio dos Bandeirantes desde então?
O pendor para a tirania de Dória está estampado em muitos de seus atos e não será a PM a lhe dar guarida nessa empreitada.
Mas a fala de outro Coronel, parece indicar a vontade de implantar uma "lei da mordaça" nos policiais militares, ou seria diferente? Leiam:
[...]  “O desafio de manter a política longe dos quartéis é grande. Há limites à liberdade de expressão, mas temos mantido a situação sob controle. A PM trabalha para o cidadão, não é polícia de governo, mas de Estado”, afirmou o secretário executivo da PM, coronel Alvaro Batista Camilo.
Palavras de quem era deputado estadual há um ano e meio atrás!
Nessa matéria, no aspecto geral, como já afirmei, tanto Renato Sérgio de Lima quanto o Coronel Glauco Silva de Carvalho reafirmam o apresentado na matéria da Piauí, mas o intuito é muito forte em deslegitimar a Polícia Militar e suas ações buscando criar um artificial clima de partidarismo institucional. Tal posição deslegitima a Instituição como um todo, inclusive seu Comando, pois põe todos no mesmo patamar e sem o mínimo de base para tal afirmação a não ser as "redes sociais".
Sofistas! Todos! É como cabe definir quem se atreve a participar de uma matéria assim.
A Polícia Militar tem entre seus integrantes pessoas das mais variadas matizes sociais e ideológicas, porém isso não faz dela partido e, como cidadãos que também somos, podemos professar nossas opiniões dentro da lei e dos preceitos regulamentares, além dos da boa educação.
Se a Polícia Militar tem partido, esse partido é o da Lei, da Ordem, da Democracia e da Proteção das Pessoas de Bem.
E como dito anteriormente, Dória é um político (muito ruim na minha opinião) e como político está na categoria que a Polícia vê com desconfiança como afirmado por Reiner, portanto, se ele cometer algo errado teremos o prazer, se possível e dentro da lei, de prendê-lo!


Obs: As referências estão nos hiperlinks em amarelo no texto.

Comentários

  1. Análise centrada, independente e muito profissional.
    A PMESP é uma grandiosa e valorosa ORGANIZAÇÃO DE ESTADO.
    Seus integrantes são cidadãos exercendo e gozando de 100% dos seus direitos fundamentais.
    Quem desqualifica, como o Cel Glauco e o senhor Renato Sérgio, não merece credibilidade, pois, minimamente, não reconhece os relevantes serviços prestados à sociedade Paulista e por analogia a Nação Brasileira.

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  2. Parabéns pela excelente análise. Já quanto ao Cel Glauco, na minha opinião, ele fez uma escolha ao se posicionar dessa forma. Equivocada. Mas está a beleza da democracia, aceitar opiniões diferentes.

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  3. Excelente texto. Assino embaixo das declarações do Cel Pelissari.

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  4. Muito esclarecedor, parabéns por seu posicionamento e riqueza em suas palavras com devida ponderação, equilíbrio sem demagogias.

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